Especialista refere educação no combate à pirataria

Um estudo realizado pelo Instituto de Harmonização no Mercado Interno revela que, apesar dos europeus valorizarem os princípios de proteção da Propriedade Intelectual, consideram a pirataria justificável em certos casos. A B!T foi entrevistar a advogada Drª Maria Cruz Garcia, da empresa J. Pereira da Cruz, especialista na defesa dos direitos da Propriedade Intelectual, para saber qual a sua opinião relativamente aos resultados deste estudo.

WIN_20131210_104853Para a advogada, o principal motivo que leva os cidadãos europeus a considerarem a pirataria justificável prende-se com o facto desta ilicitude ser vista como um crime com dano invisível. “A pessoa que normalmente comete este tipo de ilicitude não tem sensibilidade suficiente para perceber o mal que está a causar, portanto, a pessoa pensa que isso não tem qualquer problema e há de facto um bocadinho essa consciência enraizada na sociedade de que este é um crime sem vítima. Eu acho que, ao contrário do que o estudo revela, de que é uma forma de protesto contra a economia de mercado, acho que na maior parte das vezes é mais uma questão de comodismo e muito mais de desconhecimento ou de insensibilidade para a questão da pirataria do que propriamente um protesto contra a economia de mercado”, esclareceu.

Para Maria Cruz Garcia, se as pessoas fazem um download ilegal de uma música de um determinado artista é porque gostam desse artista, portanto não faz sentido fazerem um download ilegal para se manifestarem contra a economia de mercado. “É um bocadinho contraditório. Acho que é mesmo uma questão das pessoas acharem que é uma ilicitude sem consequências, que não estão a fazer mal a ninguém”, refere.

O estudo do IHMI deixa claro que os setores com utilização intensiva de direitos de Propriedade Intelectual geram 26 por cento de todo o emprego e 39 por cento do PIB na UE, pagando salários consideravelmente superiores aos de outros setores e criando mais de 77 milhões de postos de trabalho. “É justamente aqui que reside a importância da Propriedade Intelectual, porque as contrapartidas económicas decorrentes de um registo de marca, da patente de uma invenção ou da criação de uma obra artística, só existem se garantirmos que a pessoa que teve a ideia e a materializou terá o direito de exclusivo sobre a utilização e exploração da mesma”, diz Maria Garcia.

Em entrevista à B!T, a advogada refere que, na sua opinião, a crise não pode ser apontada como principal causa do aumento da pirataria. “Eu acho que em tempos de crise todos estes fenómenos ganham uma dimensão maior. A nível empresarial surgem se calhar negócios ilegais que antigamente não existiam. A nível do consumidor final, é óbvio que também poderá contribuir de alguma forma, na medida em que, havendo menos dinheiro, as pessoas comecem a cortar nas despesas mais supérfluas. E, claro, não havendo dinheiro para comprar o DVD e estando o filme disponível online, mais facilmente se faz um download ilegal do que se fica sem ver o filme. Mas, sinceramente, na minha opinião, a crise não poderá ser apontada como a principal causa. É tudo uma questão de informação, sensibilização e educação”, sublinhou.

Relativamente à Internet, o estudo revelou que uma grande percentagem de inquiridos entre os 15 e os 24 anos afirmam que é aceitável fazer download de conteúdos quando não existe nenhuma alternativa legal. Maria Cruz Garcia diz que a tendência para a pirataria é mais elevada nesta faixa etária porque os jovens são os principais consumidores deste tipo de conteúdos, com mais facilidade em aceder às novas tecnologias, e porque esta é também a faixa etária com menos capacidade económica, pois muitos destes jovens ainda não são monetariamente independentes. “É verdade que de facto isto acontece mais nas camadas mais jovens, mas também há que ter em conta o tipo de pirataria que está em causa. Mas eu acho que isto acontece porque os jovens são em larga medida os maiores consumidores de conteúdos como filmes, música, etc. Por outro lado, são também aqueles que têm maior acesso a este tipo de meios, pois, se calhar na nossa geração toda a gente sabe fazer um download ilegal mas muitas pessoas da geração dos nossos pais não sabem sequer como aceder a esse tipo de sites. E depois também têm mais tempo, o que também ajuda a se dedicarem a essas atividades. E a isto tudo junta-se também o facto de ainda não trabalharem, de ainda não serem economicamente independentes, e por isso podem não ter dinheiro para comprar esse tipo de conteúdos e como estão acessíveis grátis online, não podia ser mais fácil. Acho que é uma combinação de fatores”, declarou a advogada.

download concepts, to transfer data from internet.Questionada sobre a possibilidade das percentagens da pirataria decrescerem se a economia europeia recuperar nos próximos anos, Maria Garcia não acredita que a retoma económica possa vir a solucionar este problema: “Não me parece, muito sinceramente, que a retoma económica venha a ser a solução. As pessoas como não têm consciência de que isto é uma ilicitude, não é por terem mais ou menos dinheiro que passam a cometer menos estas práticas. Eu acho que só num caso extremo é que alguém que não tem dinheiro comete um crime para obter uma coisa que não tem. Não é tanto uma questão de haver mais ou menos dinheiro, mas sim uma questão de haver conhecimento e sensibilidade das pessoas para a questão disto ser um crime”.

Existem atualmente já alguns movimentos contra a pirataria, sobretudo contra a pirataria online, como é o caso do Mapinet (Movimento Cívico Anti Pirataria na Internet). A advogada da J. Pereira da Cruz considera este tipo de movimentos muito importantes. “Eu acho que este tipo de movimentos são muito positivos e acho que o caminho é mesmo por aí. Por exemplo, há 20 anos atrás toda a gente saía de um jantar de Natal depois de ter bebido uns quantos copos de vinho e ia conduzir tranquilamente, assim como era normal as crianças andarem nos bancos dos carros sem cadeirinha e sem cintos de segurança. Isso é um exemplo claro do que foi um movimento desencadeado pela sociedade civil que começou a alertar as pessoas para a gravidade dessas situações”, disse.

“Portanto, a mentalidade que temos hoje em dia não nos permite metermo-nos num carro sem cinto, ou seja, tudo passa por uma alteração das mentalidades. Eu acho que aqui o caminho será mais ou menos esse, sendo certo que é mais difícil porque é mais fácil sensibilizar as pessoas de que devem usar cinto de segurança do que explicar-lhes quais são os inconvenientes de fazer um download ou uma cópia ilegal. Mas penso que, pouco a pouco, as campanhas de sensibilização promovidas pelas associações que representam os titulares destes direitos, pela indústria e agora também pela própria sociedade civil começarão, mais tarde ou mais cedo, a surtir efeitos. Nesse âmbito, iniciativas como esta da B!T são de louvar porque fazem chegar a mensagem a uma grande parte do público alvo deste tipo de conteúdos”, acrescentou a especialista.

Maria Cruz Garcia defende que a melhor forma de acabar com a pirataria “passa pela educação, pela divulgação e pela publicação de notícias neste âmbito. Nestes últimos dias em que houve citações do Nelson Mandela publicadas em todo o lado e mais algum, havia uma que dizia que a melhor arma para mudar o mundo é a educação, e é mesmo isso que está aqui em causa”, afirma a advogada.

A J. Pereira da Cruz está no mercado há mais de 60 anos e desde o início que se dedica à defesa dos direitos da Propriedade Intelectual (Propriedade Industrial, Direitos de Autor, Domínios, Denominações Sociais, Franchising e Transferência de tecnologia).

A empresa regista marcas, logótipos, patentes, entre outros, e presta serviços de consultoria, análise estratégica, pesquisas de anterioridade, pedidos de registo, acompanhamento de processos de patentes e registos, averbamentos, transmissões e licenças e vigilância de Direitos registados.